Durante a vida inteira, nós mulheres vivemos situações que são constrangedoras, situações que nos fazem parecer minúsculas e que muitas vezes se iniciam pelo simples fato de sermos mulheres, pelo fato de algumas pessoas terem em mente que a mulher representa uma figura frágil, fraca e sem voz.
O momento do parto deveria ser o momento mais mágico e único na vida de uma mulher. Aliás, é o que pensamos que deveria ser. Porém, a realidade nesse contexto vai mais além. Se a mulher em diversas outras situações é constrangida por tratamentos desumanos e violentos, no momento do parto deveria ser diferente, mas ainda vemos muitos casos onde se destaca a falta de empatia pelo próximo.
MAS O QUE É VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA?
A violência obstétrica é toda ação feita sem o consentimento da mulher, que desrespeite sua autonomia e cause sofrimento/desconforto físico ou emocional tanto a ela quanto ao seu bebê, podendo ocorrer no pré-natal, parto, pós-parto e abortamento. Tal violência pode vir de qualquer outro profissional envolvido no parto, tais como enfermeiros, auxiliares, anestesistas, entre outros, e não só por parte do médico obstetra.
Segundo o site O GLOBO, no Brasil, a violência obstétrica atinge cerca de 45% das mulheres na rede pública e 30% na rede privada, por mais incrível que isso pareça. Isso reforça a ideia de que TODAS as mulheres estão suscetíveis a essa situação, muito embora saibamos que a classe mais carente está mais exposta a passar por determinadas situações.
A violência obstétrica contribui com índices significativos de mortalidade materna e neonatal, além de fazer com que a mulher perca autonomia sobre seu corpo, suas escolhas e desejos, fazendo, ainda, com que a mulher tenha abalos psicológicos pós parto, além da depressão. Essa violência pode ser caracterizada por três fatores: negligência, discriminação ou condutas excessivas.
É necessário lembrar que a violência obstétrica pode ocorrer tanto em cesárias quanto em partos normais. No momento do parto a mulher está em posição de vulnerabilidade. Portanto, nem sempre a violência é manifestada de forma clara, como xingamentos e violência física. Às vezes é manifestada de forma sutil, como a indução de certos procedimentos desnecessários. Devemos lembrar que a protagonista do parto é a mulher.
Mas não se pode olvidar que em alguns casos há riscos de complicações, que comprometem tanto a mãe quanto o bebê, necessitando diretamente na intervenção do médico obstetra.
É CASO DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA
- Mentir para a mãe quanto a sua dilatação ou o risco do bebê para indicar uma cesárea desnecessária, com o intuito de acelerar o parto ou forjar qualquer indicação não real;
- Indicar a realização de cesárias eletivas com 36 semanas antes de épocas festivas e feriados;
- Realização de parto cesárea em um feto de 5 meses ou menos, por erro de cálculo gestacional;
- Episiotomia (um corte realizado no períneo da mulher, entre a vagina e o ânus), sem a real necessidade ou sem ouvir a opinião da mulher, somente com o intuito de facilitar o parto;
- Conhecido como “Ponto do marido” é a sutura após a episiotomia de forma desnecessária, com o único objetivo de apertar a vagina para o homem sentir mais prazer;
- Realizar a tricotomia (raspagem de pelos pubianos) quando não autorizado pela mulher;
- Solicitar jejum para cesárea prolongado sem justificativa médica;
- Não permitir o contato com o bebê após o parto;
- Não permitir o direito a acompanhante durante o trabalho de parto e/ou durante o parto;
- Toques vaginais coletivos para ensinar outros estudantes quando a paciente está em situação de dor;
- Manobra de Kristeller quando não houver necessidade e se feita sem a técnica correta;
- Proibir a escolha de uma posição mais confortável;
- Xingamentos, gritos e comentários constrangedores quanto a idade, raça, o estereótipo da mulher, flertes, toques desnecessários, dentre outros. Lembramos que a violência tanto pode ser física quanto psicológica;
- Profissionais de saúde grosseiros, sem o mínimo de empatia;
- Submeter a gestante a lavagem intestinal, sem necessidade;
- Referir-se a mãe pelo leito, cor, idade, apelido e não pelo seu nome;
- Confecção de chupeta com dedo de luva após irritar-se com o choro do bebê;
- Proibir a paciente de ver o bebê;
- Mesas de parto ultrapassadas;
- Discussão entre funcionários na frente da gestante, causando extremo estresse;
- Ignorar o plano de parto;
PARTO HUMANIZADO?
Na última década tem-se falado muito sobre parto humanizado. Vemos em redes sociais uma banheira, luz no teto aconchegante, bola de pilates, fotos espelhadas da vida do casal, várias pessoas da família, fotógrafos etc, e por mais que esse cenário seja maravilhoso e desejemos um parto com todos os elementos que uma mãe merece, nem sempre esses elementos são acessíveis para todas as mulheres. Precisamos ter em mente que primordial para ter um parto humanizado é ter uma base respeitosa, humana e empática.
A realidade é que nenhuma mulher vai negar uma intervenção médica realmente imprescindível e conduzida de forma respeitosa, como uma cesariana, por exemplo. E de fato, ao ter acesso a uma equipe humanizada, a mulher se sentirá confiante em tomar qualquer decisão para não comprometer sua vida e a vida de seu bebê.
COMO EVITAR A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA?
Faça o plano de parto! O plano de parto é um documento com validade legal, reconhecido e recomendado pelo Ministério da Saúde, onde você lista as preferências do pré-parto, do nascimento do seu bebê e pós parto. Com esse documento o hospital, ou maternidade, já fica ciente de que você não é leiga e tem conhecimento.
Oriente a pessoa que a acompanhará na sala de parto. A pessoa deve ser alguém de sua confiança, o pai da criança, o esposo, a irmã, uma amiga íntima, sua mãe, tia. O importante é essa pessoa saber sobre seus desejos, necessidades e o que você não quer.
Se possível ter uma gravidez planejada e se puder escolher um médico, procure um médico com o qual você tenha afinidade. Que você veja matérias sobre ele(a) ou que o acompanhe nas redes sociais. Tente buscar depoimentos de quem já o/a teve como obstetra.
COMO DENUNCIAR
- Há várias formas de denunciar, caso você tenha sofrido violência obstétrica. Reúna toda documentação possível, incluindo prontuário médico. Lembramos que é direito do paciente ter acesso a esse documento.
- Faça reclamação junto à Ouvidoria do Hospital, à Ouvidoria do SUS, à Secretaria Municipal de Saúde da sua cidade, diretamente no Hospital e ao Ministério da Saúde ou até mesmo à representação administrativa junto ao CRM contra o médico.
- Conte com ajuda de um advogado ou defensor público.
- Ligue para o 180, telefone de crimes contra a mulher.
ACLARAÇÕES NECESSÁRIAS
Precisamos ter em mente que em todas as profissões existem profissionais bons e ruins, não somente na área da saúde. E não podemos generalizar! Existem muitos médicos bons, competentes e humanos, e são estes em quem devemos confiar.